Com um Trump acuado, 'Irã está na posição de revidar' ataque israelense, diz analista
16:12 11.11.2024 (atualizado: 21:34 14.11.2024) Especiais
Com um viés extremamente anti-EUA, o Irã está se preparando para dar uma cartada geopolítica no Oriente Médio ao revidar o ataque de Israel de forma coordenada com seus aliados na região. E, desta vez, Trump pode não estar lá para o resgate, afirmaram analistas à Sputnik Brasil.
Realizado no final de outubro, o ataque israelense a bases militares no Irã foi o último em uma série de trocas que aumentou a tensão entre os dois países. Em resposta, o governo do presidente Masoud Pezeshkian minimizou os danos sofridos.
O incidente, no entanto, não pode passar em branco, e uma represália foi prometida pelo líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei.
Desde então, detalhes do futuro ataque iraniano preocupam os atores da região. Os Estados Unidos, maior aliado de Israel,
enviaram uma bateria de mísseis de defesa área THAAD, e o governo de
Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel, requisitou mais reforços.
Cada bateria de defesa aérea THAAD consiste em seis lançadores montados em um veículo de carga e 48 mísseis interceptores, oito por lançador. Cada complexo ainda conta com um veículo com um radar de vigilância móvel e um radar de controle, bem como outro para controle de fogo tático e comunicações. Ao todo, para operar todos os componentes de uma bateria são necessários 95 soldados, segundo informações do Exército dos EUA.
Para dar detalhes do que pode estar por vir, no episódio desta segunda-feira (11), o
Mundioka, podcast da Sputnik Brasil apresentado pelos jornalistas
Melina Saad e Marcelo Castilho, conversou com especialistas da área.
O papel do Irã no Oriente Médio
De aliado dos Estados Unidos, após a Revolução de 1979 o Irã passou a adotar uma posição antiestadunidense ferrenha, destacou ao podcast a doutoranda em ciências militares e pesquisadora do Núcleo de Avaliação da Conjuntura (NAC) Amanda Marini, postura que mantém até hoje.
Esse posicionamento não só representa o descontentamento de seu povo com a influência estrangeira na sua política doméstica, mas foi também moldado para refletir insatisfações de outros países da região com a ingerência ocidental no Oriente Médio.
Dessa forma, o Irã começou a criar um discurso de protetor do Oriente Médio. "É a nossa casa, que precisa ser respeitada, diante de ameaças estrangeiras", descreveu Marini.
"E esse é o discurso que o Irã bate muito na Assembleia Geral da ONU, são os atores estatais externos que estão trazendo instabilidade para a nossa região."
Contudo, até hoje o Irã possui embates com seus vizinhos, em especial os que representam interesses estadunidenses na região, como as dinastias da península árabe e, em maior destaque, Israel.
Com o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023, as tensões no Oriente Médio voltaram a crescer após alguns anos de redução gradual. Entre as duas potências, no entanto, o conflito voltou a desandar principalmente após o bombardeio da seção consular da embaixada iraniana em Damasco, Síria, por Israel.
O ataque matou 16 pessoas, entre elas o general de brigada Mohammad Reza Zahedi, comandante da Força Quds, unidade especial do Corpo de Guardiões da Revolução Islâmica (IRGC, na sigla em inglês).
Respondendo a essa agressão, em abril, o Irã lançou um ataque composto de centenas de drones e mísseis. Telegrafados pelo próprio país, a maioria destes foi interceptada pela defesa área israelense, conhecida como Cúpula de Ferro. Novamente em resposta, Israel lançou um ataque contra o Irã que também não causou muitos danos.
Em julho, Israel atentou novamente contra a soberania e a integridade do Irã, ao assassinar o líder palestino Ismail Haniya em Teerã, onde estava para a cerimônia de posse do novo presidente iraniano.
Esse incidente, além do assassinato de Hassan Nasrallah, líder do grupo libanês Hezbollah, e do general iraniano Abbas Nilforoushan, no final de setembro, foi usado pelo Irã como justificativa para um novo ataque a Israel.
Só que dessa vez armamentos mais poderosos, como mísseis hipersônicos, foram utilizados. Cerca de 200 foram lançados em direção a Israel, com a grande maioria atingindo seus alvos: duas bases aéreas onde ficavam aviões e munições.
"Então, na segunda vez, foi um ataque mais poderoso, mais preciso e, ao mesmo tempo, mais definido", disse ao Mundioka o doutor Assad Frangieh, primeiro-tenente da reserva do Exército Brasileiro e analista de geopolítica do Oriente Médio e do Líbano.
A partir desse ataque, que evidenciou o fracasso da defesa aérea israelense em impedir os mísseis iranianos, o Irã declarou a questão por encerrada, mas o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, jurou vingança. E de fato o fez em um novo ataque, no final de outubro, envolvendo mais de 100 aviões.
Focado em instalações militares, o ataque israelense causou poucos danos ao Irã. Ainda assim, Frangieh ressalta que a provocação dá o direito ao Irã de revidar.
"E não há dúvida de que o Irã vai conseguir revidar. Mas isso passa a ser uma cartada."
Há detalhes nos discursos das lideranças iranianas que não estavam presentes antes, afirma o especialista, como a inclusão de que o ataque pode ser coordenado com o resto do Eixo da Resistência, conjunto de forças paramilitares regionais apoiado pelo Irã.
"Estamos esperando um revide que não necessariamente pode ser somente do Irã, mas envolver outras facções — os iemenitas, os iraquianos e, naturalmente, o Hezbollah."
Entretanto, o Irã também pode usar a ameaça de um grande ataque para forçar
uma resolução para o conflito em Gaza, uma vez que, com a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos,
sua posição se tornou ainda mais estável e segura.
Trump não conseguirá ajudar Israel
Ao contrário do que pode parecer em seus discursos, sempre assertivos, o recém-eleito presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump,
não deve conseguir adiantar os interesses norte-americanos no Oriente Médio.
Em seu último mandato (2017–2021), Trump protagonizou embaraços no Oriente Médio pouco noticiados pela mídia.
O primeiro, aponta o especialista, foi após o assassinato do general Qassem Soleimani. Feito abertamente pelos Estados Unidos, o Irã respondeu com o bombardeio da maior base militar dos EUA no Iraque, o que foi deixado sem resposta pelos norte-americanos.
A ação, ainda por cima, precipitou a saída das forças estadunidenses do Iraque.
"Na morte do Qassem Soleimani, o Irã conseguiu duas respostas. Mostrou força — e os Estados Unidos não revidaram — e conseguiu uma lei do próprio Parlamento iraquiano colocando as forças dos Estados Unidos como forças invasoras e a obrigatoriedade da nação iraquiana em dar uma cronologia de saída aos Estados Unidos."
Outra situação que ocorreu na época de Trump foi a retirada dos porta-aviões dos EUA do litoral iraniano. Na época, a guerra civil no Iêmen estava em seu auge, e como revide o Irã disponibilizou mísseis balísticos para os iemenitas, segundo o ex-militar brasileiro.
A partir disso, os porta-aviões norte-americanos entraram no alcance dos iemenitas, obrigando os estadunidenses a se afastarem do litoral iraniano. De 100 km da costa, os navios foram posicionados a 700 km, explicitou.
"Então o Trump, na experiência que ele teve com o Irã, ele não revidou. Ele falou alto, mas na hora do vamos ver ele recuou."
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