O orçamento secreto | Por Luiz Holanda
O orçamento secreto, também chamado de emenda do relator, é uma prática iniciada em 2020 para destinação de verbas públicas a projetos definidos por parlamentares. O nome orçamento secreto surgiu na mídia devido a falta de transparência quanto aos valores de cada repasse e dos nomes dos parlamentares envolvidos.
Segundo a oposição, foi criado para eleger Rodrigo Pacheco, presidente do Senado e Arthur Lira, presidente da Câmara, ambos aliados do governo. Tanto um como o outro sempre defenderam sua utilização, e que, segundo eles, os recursos representam menos de 1% do total do Orçamento da União, não devendo ser tratado como um problema financeiro ou político.
Segundo Lira, “Nós estamos discutindo 0,03% do Orçamento brasileiro. R$ 16,5 bilhões [valor das emendas de relator para 2022] do Orçamento do relator-geral, que viviam escondidos até 2019, nós aclaramos. E esse aclaramento gerou versões de que isso é um desmando. Toda lei tem a necessidade de ser aperfeiçoada, e nós estamos aprimorando e aperfeiçoando”. Esse comentário foi feito em Nova York.
O fato é que a disputa por recursos públicos sempre ocupou o núcleo da guerra política. Não é novidade, portanto, que o dinheiro instrumentaliza a disputa pelo poder. Aliás, dinheiro e poder sempre estabeleceram uma relação simbiótica e indissociável em qualquer parte do mundo. No âmbito das finanças públicas, essa relação fica ainda mais visível. Ela é tão significativa que a organização de nossa República, em matéria orçamentária, é uma clara aplicação do sistema de “freios e contrapesos” que caracteriza os Estados Democráticos de Direito.
O Poder Executivo elabora as leis orçamentárias, que são submetidas ao Poder Legislativo para apreciação, deliberação e aprovação. Ao Executivo cabiu o papel de principal condutor da execução orçamentária, e ao Legislativo a fiscalização. Agora é o contrário: quem comando o orçamento é o Legislativo, ou mais precisamente: o relator.
Alguém já disse que a participação do Poder Legislativo na elaboração das leis orçamentárias, por meio de emendas ao projeto encaminhado pelo Poder Executivo, e a posterior execução orçamentária desses recursos contemplados nos orçamentos pelas referidas emendas, há tempos vêm sendo um problema de difícil solução.
Os avanços obtidos nos últimos anos no combate à corrupção, na imposição de uma cultura de ética e integridade nos setores público e privado, no Brasil e no mundo, com o aperfeiçoamento constante da legislação brasileira nesse campo, não pode deixar de focar seus esforços no ainda necessário aperfeiçoamento do processo orçamentário, onde sempre esteve concentrada uma verdadeira guerra na disputa por dinheiro e poder.
Realmente, a disputa pelo dinheiro público o jogo é bruto. Todo político quer dinheiro. E a falta de transparência na sua aplicação tem facilitado fraudes nos dados dos municípios. No caso do SUS, segundo a imprensa, sua aplicação incorreta vem prejudicando os cofres públicos e a população, que continua sem estrutura na saúde pública, A imprensa publicou que o município de Santa Quitéria do Maranhão, por exemplo, fechou o ano de 2021 com R$ 5 milhões em caixa para a saúde pública. Este é o mesmo município em que morreu Gael, o segundo filho de Clarete Silva e Francisco Edson, em março deste ano, por falta de UTI neonatal na cidade. Isso tudo apesar das verbas que lhe foram destinadas no orçamento secreto.
Não devia existir orçamento secreto. A imprensa, de um modo geral, aponta violações à Constituição, mostrando a compra de apoio político por meio da liberação das emendas de relator. Se não houver alguma reação, tudo indica que assim vai continuar.
*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.
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