Ponto de Vista: A carta de Trump

Por Luiz Holanda*
1 dia, 14 horas
Uma carta tanto pode ofender quanto humilhar, principalmente se nela existir palavras ou informações constrangedoras, desrespeitosas, injustas ou ofensivas. Também pode conter a intenção de enfraquecer o interlocutor com a sua leitura em público ou através de uma divulgação em uma grande rede de comunicação. A carta de Trump enviada ao presidente Lula está sendo considerada nesse sentido. Mesmo assim, o que nos preocupa não são as animosidades políticas ou as antipatias pessoais por acaso existentes entre os dois presidentes, mas a repercussão econômica das medidas nela contidas. O tarifaço de 50% aos produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos deixou as associações e entidades empresariais brasileiras num estado de choque, apontando impactos negativos em diferentes segmentos do nosso setor produtivo. Acrescente-se a isso a ameaça de Trump de abrir investigação sobre as ações do Brasil contra as big techs americanas.
Com essas medidas, alguns economistas apontam a possibilidade de redução do PIB brasileiro caso não haja uma negociação entre as partes para reverter o tarifaço. O motivo desse aumento abusivo das taxas americanas não é econômico, pois nas transações comerciais entre os dois países os americanos levam vantagem. Por outro lado, a prudência manda avaliar com muita calma as retaliações, porque os impactos das tarifas podem prejudicar nossa indústria, muito interligada ao sistema produtivo americano, bem como causar impactos sobre os empregos no Brasil, tanto na produção e investimentos como no comércio em geral. Até recentemente o comércio de bens e serviços entre o Brasil e os Estados Unidos tem gerado benefícios concretos para ambos os lados, sendo superavitário para os Estados Unidos ao longo dos últimos 15 anos — com saldo de US$ 29,2 bilhões em 2024, segundo dados americanos. Isso significa que as razões para o aumento das tarifas não foram econômicas. Mesmo levando-se em consideração os arroubos americanos, nós não temos condições nem poder para competir com a maior potência econômica e militar do mundo. Segundo Bismarck, "A diplomacia sem as armas é como a música sem instrumentos".
A revista britânica The Economist acha que nosso presidente é “incoerente no exterior" e "impopular em casa", conforme reportagem publicada no domingo (29/6). O artigo gerou uma resposta do ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, que rebateu em nota na terça-feira (1/7). Outro jornal importante a criticar o presidente Lula foi o Wall Street Journal, culpando-o por todos os males porque passa o Brasil. O Washington Post também seguiu no mesmo tom, afirmando que os Estados Unidos esperavam que Lula fosse um parceiro para o Ocidente após a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas o presidente brasileiro parece ter “seus próprios planos”. Outra consequência da carta se refere ao ministro do STF Alexandre de Moraes.
A carta critica as decisões do ministro que resultaram no bloqueio de redes americanas no Brasil. Como se sabe, Moraes determinou a suspensão da plataforma Rumble após a empresa descumprir uma série de decisões, como a remoção do perfil do jornalista Allan dos Santos, o bloqueio de repasses financeiros feitos a ele e a indicação de um representante legal da empresa no país. A carta está sendo interpretada como um prenúncio de sanções contra Moraes, conforme depoimento do secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, durante audiência na Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Representantes dos EUA. Ao ser questionado pelo deputado republicano Cory Mills sobre a possibilidade de sanções contra o ministro, usando como base a Lei Magnitsky, legislação que permite aos Estados Unidos punir estrangeiros acusados de violações de direitos humanos, o secretário Rúbio respondeu: “Isso está sob análise neste momento, e há uma grande possibilidade de que isso aconteça”. A Lei Magnitsky é um dispositivo da legislação americana que permite que os Estados Unidos imponham sanções econômicas a acusados de corrupção ou graves violações de direitos humanos. Foi aprovada no governo de Barack Obama após a morte de Sergei Magnitsky, advogado russo que denunciou um esquema de corrupção envolvendo autoridades de seu país e morreu em uma prisão de Moscou, em 2009. Em 2016, uma emenda ampliou seu alcance, permitindo que qualquer pessoa envolvida em corrupção ou abusos contra os direitos humanos seja incluída na lista de sanções. Recentemente o governo americano anunciou restrições de visto para estrangeiros que “censuram” americanos. Em outras palavras, o Brasil e os Estados unidos não estão se entendendo, nem política nem economicamente. Faltam diálogo e diplomacia.
*Luiz Holanda é advogado e professor universitário.
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