Prolongada ocupação de áreas palestinas acabou por “envenenar” o Estado judeu
Demétrio Magnoli
Folha
Israel nasceu do horror do Holocausto, como fortificação de defesa dos judeus. Dessa origem derivam relações paradoxais entre os judeus da diáspora e o Estado de Israel. Como explica Bernardo Sorj: “O Estado de Israel se autodelegou a representação do povo judeu, e boa parte das instituições judaicas da diáspora foram transformadas em instrumentos de defesa do Estado de Israel perante a opinião pública. Consequências: o apoio e justificação de toda e qualquer política do governo e a perda de autonomia política.”
Sorj destaca uma diferença crucial. Na diáspora, como minoria (e, frequentemente, minoria perseguida), os judeus desenvolveram uma sensibilidade particular para os direitos humanos. Já em Israel, os judeus são maioria –e, desde 1967, cidadãos de um Estado ocupante. Daí que os judeus da diáspora viram-se na posição paradoxal de aceitar, às vezes com indignação ou extrema relutância, a violação, por “seu” Estado, do direito nacional palestino. Tornaram-se reféns políticos dos governos israelenses, que não elegeram.
CAUSAS DA GUERRA – A história de Israel/Palestina não deve ser contada no registro da caricatura. A Nakba (catástrofe palestina) de 1948 foi deflagrada pela rejeição dos países árabes ao plano de partilha da ONU, não por um projeto sionista de expansão territorial.
A Guerra de 1967, que terminou com a ocupação dos territórios palestinos, foi semeada pela recusa do Egito de Nasser a admitir a existência de Israel.
A VEZ DOS FANÁTICOS – Mas a prolongada ocupação envenenou o Estado judeu, conferindo maiorias eleitorais às correntes engajadas no expansionismo e no messianismo bíblico: os fanáticos do Grande Israel. Os palestinos são as vítimas diretas dessa tragédia histórica. Os judeus da diáspora são suas vítimas indiretas.
Netanyahu montou o governo mais extremista da história de Israel: uma coalizão que abrange até fanáticos religiosos e supremacistas judaicos. Sabotou a retomada de negociações de paz. Estimula colonos israelenses na Cisjordânia a humilhar cotidianamente os palestinos.
Tentou subordinar a Corte Suprema à maioria parlamentar a fim de destruir um pilar central da democracia israelense. Estabeleceu parcerias privilegiadas com Trump e Bolsonaro. Um segmento da diáspora judaica acompanhou sua aventura, associando-se à extrema-direita.
CRESCE O ANTISSIONISMO – Sob Netanyahu, a imagem internacional de Israel (e, junto, a dos judeus) sofreu danos profundos. Fertilizou-se o solo no qual cresce a antiga árvore do antissemitismo, com suas ramificações à direita e à esquerda.
Nos EUA e na Europa, ameaçadoras estrelas de Davi aparecem pintadas na fachada de residências de judeus e policiais protegem sinagogas.
O grito “Palestina livre, do mar até o rio”, uma senha que indica o objetivo de destruição do Estado de Israel, fez seu caminho até os protestos nominalmente pacifistas contra a ação militar em Gaza. O antissemitismo pulsa sob a película retórica do antissionismo.
A NOVA ESQUERDA – A diáspora judaica não vive em guetos: envolve-se nos fluxos políticos das sociedades nacionais. Nos últimos tempos, correntes progressistas da diáspora alinharam-se à “nova esquerda”. Desde os atentados do 7 de outubro, elas descobriram, com ingênua consternação, que as sementes do antissemitismo florescem nos meios identitários e “decoloniais”.
Nessas zonas ideológicas, Israel é descrito como “Estado colonial racista” – e o culto à “resistência” do Hamas é, quando muito, apenas disfarçado por sentenças protocolares de desaprovação do terror. Os judeus de esquerda nunca estiveram tão sós.
Os israelenses têm sérios motivos para se livrarem de Netanyahu: com ele, não haverá paz – e, sem paz, não existirá segurança. Os judeus da diáspora têm um motivo existencial: o governo que os mantém reféns oferece pretextos perfeitos para a maior onda histórica de antissemitismo desde o Holocausto.
“Vamos votar e derrubar”, diz senador sobre vetos de Lula ao Marco Temporal
Aline Brito
Correio Braziliense
Após o adiamento da votação dos vetos presidenciais ao projeto de lei que cria o marco temporal como critério para regularização de terras indígenas, nesta quinta-feira (23/11) o senador Marcos Rogério (PL-RO) disse estar convicto de que esse vetos serão derrubados pelo Parlamento. De acordo com o parlamentar, a intenção é que os 34 vetos voltem a ser pautados na sessão do Congresso Nacional marcada para a próxima terça-feira (28/11).
“Eu tenho convicção de que, pela votação que tivemos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, e pelas conversas que estamos tendo, vamos votar e derrubar os vetos ao Marco Temporal”, garantiu o senador.
FALTA DE ACORDO – A sessão que discutiria os 34 vetos estava marcada para a manhã desta quinta-feira, mas foi cancelada por falta de acordo. Apesar de a justificativa oficial dada pelos parlamentares ter sido a falta de espaço disponível, uma vez que o Plenário da Câmara estava sendo usado para outra reunião, não há acordo entre a base do governo e a oposição sobre os vetos do Arcabouço Fiscal e do Conselho Administrativo De Recursos Fiscais (Carf).
Mesmo com a ida de diversos parlamentares para a 28ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-28), de 30 de novembro a 12 de dezembro, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, a expectativa dos deputados e senadores é que os vetos e os sete projetos de liberação de crédito sejam votados na próxima semana.
“A Lei do Marco Temporal, votada pelas duas Casas, e os vetos do presidente Lula precisam ser deliberados. Esse tema gera insegurança jurídica para o país, há um ambiente de muito desconforto por parte de quem está no campo, do setor produtivo. Cabe ao Congresso Nacional deliberar, mas só conseguiremos fazer isso se houver sessão. Estamos trabalhando para que essa sessão aconteça na próxima semana e, aí sim, enfrentarmos os vetos ao marco temporal”, disse Marcos Rogério.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – No caso do marco temporal, a derrubada dos vetos de Lula é considerada tranquila. Na próxima semana, o plenário do Senado também deve votar o projeto de taxação dos super-ricos (PL 4.173/2023), o das apostas esportivas (PL 3.626/2023) e o chamado PL do Veneno (1459/2022), que muda o registro dos defensivos agrícolas. Uma semana agitada. (C.N.)
Base aliada no Congresso já começa a impor ao governo limites na economia
José Casado
Veja
O Congresso deu a Lula tudo que ele pediu. Antes da posse, por exemplo, autorizou-lhe uma espécie de cheque em branco para garantir a transição, de cerca de R$ 140 bilhões. Com o governo instalado, avançou no debate da reforma tributária, das novas regras de controle fiscal e das leis de orçamento. Nesta terça-feira, o Legislativo começou a mudar de rumo.
Nesta terça-feira (21/11), a Câmara aprovou um projeto do Senado que diminui o recolhimento do FGTS e da Previdência Social em contratos de primeiro emprego e de recolocação profissional.
IDEIA DE GUEDES – O texto é inspirado numa proposta que o ex-ministro da Economia, Paulo Guedes, apelidou de “Carteira Verde e Amarela”. Por ser ideia originária do período Jair Bolsonaro, entre outras razões, o governo e o Partido dos Trabalhadores ficaram contra, mas não apresentaram alternativas. Acabaram derrotados: 286 votos a 91.
Ao mesmo tempo, a Câmara decidiu establecer urgência para a votação em plenário de um decreto legislativo para derrubar uma portaria editada pelo ministro Luiz Marinho, do Trabalho, impondo restrições ao funcionamento do comércio em geral nos domingos, dando às entidades trabalhistas poder de controle e fiscalização a partir de acordos coletivos. Essas regras haviam sido abolidas no governo Bolsonaro.
Outra vez, governo e PT não apresentaram alternativas. E perderam, de novo. A derrota foi ainda mais expressiva: 301 votos a 131.
APOIO RESTRITO – Nas duas votações ficou claro que partidos aliados, principalmente do centrão, resolveram confrontar o governo a que estão associados, rejeitando propostas oficiais que julgam nocivas para a economia
A área de Marinho, no Ministério do Trabalho, é uma frente de disputa, mas não é a única. Prepara-se, por exemplo, o bloqueio da reestatização da Braskem, petroquímica cujo controle está dividido entre a Petrobras e o antigo grupo Odebrecht, agora Novonor. O governo induz a venda a metade do controle da empresa para uma empresa estatal dos Emirados Árabes, numa operação em que, no final, a Petrobras passaria à posição de sócia majoritária.
Será difícil para o governo repetir em 2024 a fluidez no desempenho legislativo observada neste ano.
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