quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015
O andar de cima
O andar de cima
Luiz Holanda
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), em entrevista ao Programa Brasilianas, da TV Brasil, comentou sobre as dificuldades da justiça em prender os que ele próprio considera como gente poderosa, moradora do “andar de cima” do nosso estratificado edifício social. Esse comentário parece confirmar sua declaração quando percorreu o caminho do beija-mão a que se referiu seu colega Luiz Fux. Naquela ocasião ele declarou que, no julgamento do mensalão, o Supremo havia atuado “um ponto fora da curva”.
Para colocá-lo dentro da curva foi necessário fazê-lo retornar ao que ele sempre foi: o foro privilegiado do pessoal do andar de cima, amparados pelos garantistas da impunidade, integrantes de sua maioria circunstancial. Num dos momentos mais constrangedores da história desse tribunal, Barroso, ao recusar um embargo de declaração da defesa do seu amigo José Genuíno, lamentou condenar um homem que era um “herói da resistência” e um “símbolo de valores igualitários e republicanos”. Foi criticado pelos próprios colegas.
Esse “símbolo” foi condenado pelo Supremo a 6 anos e 11 meses de reclusão por compra de votos de parlamentares para apoiar o governo quando era presidente do PT. Tempos depois, esse “herói” foi acusado pelo coronel Lício Augusto, em pleno Congresso Nacional, de ter traído e delatado os companheiros por ocasião de sua prisão na Guerrilha do Araguaia.
Barroso também contribuiu para a mudança de entendimento do tribunal ao decidir - juntamente com os demais garantistas-, que as três maiores estrelas do PT, condenadas pelo próprio STF por formação de quadrilha, não cometeram o crime de quadrilha. Em consequência dessa decisão, todos estão em casa juntos de suas famílias.
Mas as patacoadas do ministro não param por aí. Em artigo publicado em 2002, em parceria com a colega de escritório Carmem Tibúrcio, ele, discorrendo sobre a extradição no direito brasileiro, declarou que existindo tratado de extradição firmado pelo Brasil, não há discricionariedade do Presidente da República em entregar ou não o extraditando, mas sim sua vinculação ao tratado. Em outra ocasião, sobre o mesmo assunto, no julgamento de Cesare Battisti (condenado por assassinato pela justiça italiana), defendeu sua permanência no Brasil afirmando que o entendimento por ele expresso no artigo era o da colega, e não o dele.
No julgamento que absolveu os réus do mensalão por crime de formação de quadrilha, o então ministro Joaquim Barbosa disse que o governo criara uma maioria circunstancial no STF, que seria mantida por muito tempo. Essa maioria deverá se tornar, ao final do governo Dilma, unanimidade, pois até lá ela terá nomeado, além da vaga deixada por Barbosa, as seis outras decorrentes das aposentadorias que irão ocorrer até 2018.
Barroso e os demais integrantes da maioria circunstancial (Lewandowski, Toffoli, Rosa Weber, Carmem Lúcia e Marco Aurélio Mello), contam com o apoio de outro garantista - o ministro Teori Zavascki-, que concedeu uma liminar revogando a prisão de Renato Duque, ex-diretor da Petrobrás e a quem competia cuidar da propina destinada ao PT, segundo Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef. Antes ele já havia libertado o Paulo Roberto, preso novamente por ordem do Juiz Sérgio Moro.
Ora, se o ministro Zavascki – por erro ou por outros motivos-, revogou a prisão preventiva de Renato Duque, contestada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não existe razão para os demais acusados continuarem presos. Barroso tem razão quando declara existir uma estratificação na sociedade brasileira, pois aqui nem todos somos iguais. Segundo Aristóteles, “O único Estado estável é aquele no qual todos os homens são iguais perante a lei”. Não é o caso do Brasil, onde nós, o povo, moramos no térreo, enquanto os poderosos, aí incluído o ministro Barroso, moram no andar de cima.
Luiz Holanda é advogado, professor universitário e conselheiro do Tribunal de Ética e Disciplina da OB/BA.
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